Uma alternativa melhor para o "retorno à normalidade"

Adam Grant, professor da Wharton, sugere medidas que podem ser tomadas pelos executivos quando a ameaça da COVID-19 começar a desaparecer

Ilustrações de cortesia da iStock

O ano de 2020 nos forçou a repensar muitas coisas. Nós nos fizemos perguntas como: “É seguro sentar-se em um restaurante para fazer uma refeição?” e “Posso ser produtivo mesmo não estando na mesma sala com meus colegas?”

A partir de 2021, temos a oportunidade de repensar de forma mais proativa e deliberada. O que é preciso para repensar de maneira eficaz — questionando opiniões, suposições e conhecimentos — e como você pode assumir esse papel na sua organização? Recente, conversei com Sandeep Mathrani, CEO da WeWork, sobre isso no WeWork Innovation Summit.

Crie uma cultura de segurança psicológica

Segurança psicológica é a sensação de que você pode correr risco sem ser punido. Você pode dizer “Eu não sei isso” ou “Eu cometi um erro”. Ou ainda, pode pedir ajuda para outra pessoa. 

Temos muitas evidências de que, quando as equipes têm segurança psicológica, elas são menos propensas a cometer erros. Também sabemos que a segurança psicológica é um grande motor da inovação, porque quando as pessoas sentem que podem correr riscos, permitem que as ideias fluam livremente. Quando elas sentem que não podem, ficam em silêncio.

Pense em um chefe que diz: “Não traga problemas, traga soluções.” Essa é uma filosofia perigosa, porque se as pessoas só falam quando tiverem uma solução, você nunca conhecerá os maiores problemas, aqueles que são complexos demais para uma pessoa resolver sozinha.

A base da segurança psicológica é criar um ambiente onde as pessoas possam indicar os problemas e soar os alertas, mesmo que não tenham poder, experiência ou recursos para enfrentá-los. Esse é o início da criação de uma cultura na qual as pessoas estejam dispostas a pensar novamente.

Conte com colaboradores dissonantes 

Pessoas com perfil colaborativo são aquelas que sempre perguntam como podem ajudá-lo e que estão compartilhando conhecimento e resolvendo problemas constantemente. Elas se dispõem a ir além da sua função formal e, ao mesmo tempo, são essenciais para a eficácia da equipe.

Pessoas que não colaboram, por outro lado, querem apenas saber o que você pode fazer por elas. São pessoas que querem monopolizar os projetos interessantes e visíveis, despejando o trabalho pesado para todos os outros e concentrando a maior parte do crédito de realizações coletivas.

Mas existem também traços de personalidades em que as pessoas demonstram concordância ou discordância. As pessoas que sempre concordam são mais calorosas, amigáveis e educadas. Pessoas que demonstram discordância são mais críticas, céticas e desafiadoras.

Concordar ou discordar é um verniz social — a forma pela qual o relacionamento pode ser agradável ou não — enquanto a colaboração reside na motivação interna — valores e intenções ao interagir com outras pessoas. 

Colaboradores que concordam com tudo podem parecer os melhores membros da sua rede de suporte, uma vez que adoram encorajar, tranquilizar e torcer por você. O problema é que pessoas assim não gostam de conflitos, e muitas vezes não dizem o que você precisa repensar.

Para pensar e repensar com eficiência, precisamos de colaboradores dissonantes em nossa rede. Essas são as pessoas que podem parecer grosseiras, mas no fundo estão apenas tentando ajudar. Eles oferecem desafios, porque se importam com o resultado. Eles fazem perguntas difíceis e fornecem feedback crítico que muitas vezes não queremos ouvir, mas precisamos ouvir.

Desenvolva uma rede desafiadora

Sua rede desafiadora é o grupo de pessoas em que você confia para detonar suas ideias. Ela é composta de colaboradores dissonantes, as pessoas que nos dão aquela responsabilização del que precisamos para reexaminar a maneira como sempre fizemos as coisas.

Se você traz uma prática, ideia ou decisão para um colaborador dissonante, ele mostrará o lado que você não está vendo para torná-la melhor. Eles não apenas são os defensores mais apaixonados por pensamentos novos e não convencionais, como também os defensores mais confiáveis.

Nos últimos anos, entrei em contato com meus maiores críticos, os colaboradores mais dissonantes da minha vida profissional e disse a eles: “Oi, talvez você não saiba, mas considero você um membro fundador da minha rede desafiadora.” 

Eu disse a eles que houve momentos em que foi difícil receber feedback. Algumas vezes, senti-me na defensiva. Outras vezes, considerei o feedback como uma distração, apenas descartando-o. Mas sempre gostei de como eles me incentivaram a dar o melhor de mim.

“E, se você já hesitou em me dizer o que realmente pensa porque está preocupado em prejudicar nosso relacionamento ou ferir meus sentimentos, não faça isso”. “A única maneira de ferir meus sentimentos é não me dizer a verdade.”

Essa conversa fez com que essas pessoas passassem a colaborar com formas de feedback ainda mais profundas. 

Questione as práticas recomendadas 

O próprio conceito de práticas recomendadas me assusta um pouco. Porque no momento em que você declara uma prática como “recomendada”, está declarando que não há nada que possa melhorar. 

Em vez de práticas recomendadas, podemos buscar práticas melhores. Deixe de pensar como um pregador ou um juiz inquisidor, e comece a pensar mais como cientista.

Quando você pensa como pregador ou como um juiz inquisidor, passa muito tempo defendendo suas próprias ideias e tentando provar sua perspectiva quando alguém discorda de você. Quando você pensa como cientista, não deixa suas ideias se fundirem com sua identidade, e essa prática pode resultar em muito mais flexibilidade para repensar as coisas.

Assim, quando um lançamento de produto ou serviço não acontece como você pensou, você pode dizer: “Tudo bem, minha hipótese estava errada, ou meu experimento não foi bem sucedido. Agora, preciso repensar meu produto, serviço, mercado ou estratégia”. Essa flexibilidade permite que você tente algo com uma probabilidade maior de funcionar.

A vantagem de pensar como cientista é que você encontrará motivação para buscar os motivos pelos quais talvez esteja errado, não apenas motivos pelos quais deve estar certo.

Troque brainstorming pelo brainwriting

É claro que você quer ter certeza de que está colocando as melhores ideias na mesa. E a maneira de fazer isso para a maioria de nós é dizer: “Vamos fazer um brainstorm”.

Mas temos mais de 40 anos de evidências de que é possível obter mais ideias (e ideias melhores), permitindo que as pessoas trabalhem de forma independente. Sempre vemos três coisas erradas em sessões de brainstorming:

1. Bloqueio de produção: Como não é possível falar ao mesmo tempo em um grupo, algumas ideias se perdem.

2. Medo de parecer idiota: as pessoas não compartilham as ideias mais originais. 

3. O peso da liderança: A “opinião da pessoa que ganha mais” acaba tendo um peso maior, e as pessoas acabam seguindo essa pessoa. Assim, você acaba com muitos pensamentos convergentes e menos pensamentos divergentes.

A solução mais simples para todos esses problemas é trocar o brainstorming pelo brainwriting. Dê as informações para as pessoas com antecedência e deixe que elas pensem de forma independente, sabendo que indivíduos geram ideias mais variadas e brilhantes do que grupos.

Em seguida, quando receber todas as ideias, deixe o grupo fazer a seleção e o refinamento. Use a sabedoria coletiva para descobrir quais ideias realmente valem a pena.

As tecnologias virtuais foram projetadas para o brainwriting. A janela de bate-papo em uma videoconferência é perfeita para isso. Eu levo as pessoas para uma reunião e digo: “Há algo sobre o qual queremos repensar. Darei 10 minutos para vocês pensarem sobre isso e, em seguida, enviarem suas ideias na janela de bate-papo. Em seguida, nós leremos as ideias e conversaremos sobre elas.”

O ideal é que o líder não expresse sua opinião até que todos os outros tenham compartilhado as suas. Dessa forma, eles são menos propensos a sentir a pressão e ceder ao peso da liderança.

Pratique a colaboração intermitente

Minha colega Anita Woolley estudou equipes de software virtuais que trabalham remotamente e descobriu dois padrões de comunicação dominantes: 

1. Baixa frequência, alta intensidade: as equipes não estavam em contato todos os dias, mas quando estavam, a troca de mensagens era intensa.

2. Alta frequência, baixa intensidade: quando as equipes mantinham o contato com muito mais regularidade, não havia tantas mensagens por hora.

E os dados demonstraram que a intensidade, e não a frequência, acaba prevendo a produtividade, a criatividade e a colaboração remota. As equipes de baixa frequência e alta intensidade conseguiram cair em um padrão explosivo, com uma colaboração literalmente repleta de energia e ideias.

O envolvimento é maior quando você está sincronizado no tempo com as pessoas da sua equipe; assim, com essas explosões, as equipes se envolvem com uma colaboração intermitente.

Elas podem trabalhar de forma independente por alguns dias, gerando muitas ideias. E então, elas podem ir além da reunião, efetivamente ajudando com o trabalho quando sabem que seus colegas estão on-line, pois estão prontas para entrar em ação para resolver um problema ou ajudar em algo.

Quando você oferece às pessoas uma oportunidade de colaborar de forma intermitente, permite que elas trabalhem individualmente e, em seguida, dediquem um tempo quando todos estão disponíveis para trabalhar em grupo.

Nos próximos meses, os executivos — de startups a grandes corporações — continuarão a se perguntar: “Como é possível promover a união entre as pessoas e tornar o grupo maior do que a soma de suas partes?” Essas ideias chegam à resposta.

Adam Grant é professor de psicologia organizacional na The Wharton School da Universidade da Pensilvânia, autor do best-sellerThink Again: The Power of Knowing What You Don’t Know (Pense duas vezes: o poder de saber o que você não sabe, em tradução livre) e anfitrião do WorkLife, um Podcast TED Original.

Repensando seu espaço de trabalho?

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